Mais um passeio no zoológico
Por Túlio
Tarde ou cedo, atrasado ou não, sobre isso nunca se saberá ao certo. Mas é provável que a enrolação pré-show e a abiogênese de amigos seja verdadeira culpada para os representantes deste blog perderem o show do Holger e 'quase' perder o El Mato Un Policia Motorizado, metade da escalação do festival, que incluiu também Super Furry Animals e Gogol Bordello.
O 'quase' figura no parágrafo acima porque deu para pegar o final do show argentino. Los hermanos de verdade tocavam 'Prenderte Fuego' quando me aproximei do palco. E os poucos minutos que a banda me reservou foram mais intensos do que as longas horas do Super Furry Animals. Os intrumentos em sintonia no palco definiam uma frequência peculiar, havia momentos em que tudo parecia animado e pulsante, e logo depois surgem enlaces pseudo-lentos, que só impulsionam a próxima forma que está por vir. Foram bons minutos imersos naquele som, mas como a maioria da platéia estava apática, é provável que alguma coisa estranha tivesse acontecido por ali. Talvez o ritmo aqui relatado não tenha sido o predominante no show, e no momento de uma maior inspiração, o subconsciente coletivo já tivera criado a imagem ruim da banda.
O maior feito do SFA foi a multiplicação. O público pareceu ter aumentado sensivelmente durante a passagem dos shows, criou-se uma grande expectativa para o show da banda, os nostálgicos começaram a ficar animadinhos, 'O show no Tim foi foda', 'foi muito bom'... Ok, vamos lá. E o show começou, mas parece que algo estava errado lá. Não, a culpa não é do técnico de som, o cabo que não estava conectado direito era o da cabeça dos músicos. Eles estavam lá, compenetrados em seus instrumentos, levando um som estridente, que não empolgava. Juro que me esforcei para tentar gostar, mas à medida que pulava, também não conseguia ficar muito preso no show. Foi como se a banda estivesse fazendo teste pro 'Ídolos' na minha frente, e eu fosse amigo de alguém lá, mas não gostasse do som.
Poucos momentos realmente foram excitantes, a banda demorava para engatar uma frase de guitarra safada, e quando a fazia, repetia tanto que toda a malevolosidade sumia. A forma encontrada para interagir com o público era por placas, com dizeres de 'Obrigado', 'Aplausos' e 'WOAH!', prevendo a ineficiência do som, eles até que foram bem inteligentes em achar uma forma de animar a platéia. Uma dessas placas tinha a foto do Nick McCarthy, guitarrista do Franz Ferdinand, para marcar a 'participação' na música "Inaugural Trams", mas só a foto não adiantou muito. Se o ferdinando estivesse ali, tenho fé que ele passaria parte do espírito incendiário que foi do show de sua banda na mesma Fundição, em 2006, em que o guitarrista escalou a armação metálica da casa só para jogar uma paleta ao público aloprado.
Parte do Kraftwerk baixou na banda durante a apresentação. Alguns elementos robóticos caíram na sopa, que começou a dar curto circuito. O que se via no palco, e o que se escutava, não casavam muito bem. É discutível o produto de tanta confusão, muita gente deve ter gostado, mas eu e os demais só conseguimos ter acesso a parte podre da reação, a chatice, que aparecia em excesso... "Mas veja só, eles são do País de Gales!", é mesmo! Então, esqueça tudo, o show foi do cacete!
E tudo acabou piorando. Uma hora e meia depois dalí eu sentia que meu pé iria quebrar em três, minha coluna rachar e apesar de tudo isso, não poderia estar mais feliz. Depois de uma introdução, "Ultimate" foi a senha para ligar o triturador do Gogol Bordello. Uma grande roda se instalou na Fundição e deu início a maior festa da noite.
Ao contrário dos Power Rangers, cada integrante do Gogol Bordello tem sua história em guetos diferentes do mundo. Cada um escreve uma página do show em seu dialeto, um livro sobre rock, reggae, música ucraniana, batidas russas ou qualquer coisa que traduza a universalidade musical. A leitura é constantemente selvagem, com uma potência que não deixa o batimento cair. A reações do Eugene Hutz transcrevem bem o que se passava ali, uma inquietude infinita que direcionava o espírito animalesco situado ali, digno de nota na obra de Plínio, o velho.
Eugene Hutz é o homem que puxa o bonde, mas não há um no palco que não entre no ritmo. O violinista Sergey Ryabtsev é uma das figuras mais peculiares que eu já vi num palco. Com seus 51 anos, ele aparenta estar bem longe do fim da garrafa, e impressiona por conseguir tocar mesmo numa dança frenética com o resto da banda. Há de se lembrar também das duas belas senhoras que não pararam no palco, as dançarinas são um espetáculo a parte, pagaria só para ver elas se apresentarem. Além das performances, elas atacam de percussionistas e backing vocals, mas eu não paro de imaginar o que elas fariam na cama...
Esse povo todo junto criou um clima alegre e contagiante. As pessoas se dividiam em 'dançar' e berrar as músicas, "Start Wearing Purple" foi uma coisa linda, meu pé e garganta que digam. Algumas boas surpresas na setlist, como a presença de "Frevo Mulher" e "Pagode Russo", engrandeceram o show, que contou com a participação de uma banda cigana tupiniquim. Duas das melhores faixas do "Super Taranta" ficaram de fora, "Harem In Tuscany" e "American Wedding"- ponto alto do show que o Gogol fez no Tim-, mas nada que decrescesse a festa. No fim, o corpo tendia a desmoronar, mas valeu a pena.
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Samba, Suor e Ciganos
Por Otaner
Desde que surgiu, eu nutro bastante simpatia pelo Festival Indie Rock. Mesmo com os cancelamentos que a segunda edição sofreu até finalmente acontecer na sexta-feira 13, as bandas escaladas para tocar costumavam me agradar em cheio. Recapitulemos: na primeira edição, que aconteceu em 2007, em um dos dias trazia Móveis Coloniais de Acaju, Nação Zumbi e The Rakes ao Circo Voador. As duas primeiras, se você estiver lendo pela primeira vez o blog, dê uma pesquisada nos outros textos e verás que são assunto quase todo mês por aqui.
Já The Rakes, apesar de muita gente torcer o nariz, eu mantenho meu narigão em linha reta mesmo. Adoro os discos deles, despretensiosos e diretos naquela quase apropriação indébita em cima do Gang of Four. E o show, que começou morno, foi aumentando de temperatura até chegar em um ponto de ebulição que significou ter gente da banda no público e parte do público no palco. Público pequeno, mas a cara de satisfação de todo mundo era evidente. A banda já acabou, eles não salvaram o rock, mas trouxeram um pouco de diversão.
Aí vieram os cancelamentos. Primeiro notícia em jornal dizendo que Yo La Tengo e Editors (além de uma banda porcaria que tocou no último Tim Festival) seriam as próximas atrações. Anunciamos aqui, inclusive. Não aconteceu, mas Editors, nos seus dois primeiros discos, está entre minhas preferidas "bandas novas". E Yo La Tengo seria clássico.
Passado um tempo, chegaram a anunciar no orkut através do perfil oficial do festival as bandas que se apresentariam, dessa vez no Canecão: Futureheads, Dandy Warhols, Broken Social Scene, Late of the Pier, Mombojó, Do Amor, Macaco Bong, Cidadão Instigado. Ou seja, muita coisa boa. Avisamos aqui na maior alegria e... pfffff, problemas com patrocínio inviabilizaram o festival.
Então não foi sem desconfiança que recebemos a notícia que agora sim o festival ia desencantar. Mais uma vez, uma ótima escalação: El Mató a un Policia Motorizado, Super Furry Animals e Gogol Bordello. Mais uma vez um preço na medida do possível honesto. E, diferente da primeira edição, numa sexta-feira.
O show do Holger, banda paulista que começa a ser comentada aqui e acolá, por pequenos problemas de cálculo, eu e o Tulio perdemos. O do El Mató a un Policia Motorizado ("El Mató", para os íntimos), bom... Se a gente pudesse definir o show de uma banda pela última música que tocaram, eu diria que foi um show maravilhoso que os amigos portenhos do Superguidis fizeram. Ótimo som de guitarras, uma viagem instrumental quase épica que deu vontade de ter visto um pouco do que eles fizeram antes. Ou talvez tenha sido o momento e o tempo certo de vê-los. De qualquer forma, se quiser saber mais sobre esses dois shows, parafraseando o Tim Maia fase Racional, leia o Lívio.
Acho que quem melhor pode definir o show do Super Furry Animals é o próprio vocalista da banda, o Gruff Rhys. Gruff, diz aí pra gente de quanto foi o rendimento de vocês no Indie Rock:
Pois é, concordo. 75%. Bandas que apelam para o visual correm o risco de parecer que seu som não basta? Pode ser, mas seria uma óbvia bobagem dizer isso sobre os animais galeses. Se nem todo o repertório pega, esquenta ou chama a atenção, os momentos em que eles casam guitarras barulhentas, com batidas eletrônicas e vocais harmoniosos são bem interessantes e agradam até quem não conhecia tanto do trabalho deles. Um pop inteligente com boas misturas que acabam se tornando uma assinatura não-óbvia de cada canção. Ótimos momentos em músicas como "Juxtaposed With U", "Crazy Naked Girls" (a melhor), "Hello Sunshine".
Não houve muita espera até que Eugene Hutz trouxesse a sua ONU musical chamada Gogol Bordello. Na verdade, daria pra dizer que aquilo é quase o elenco da série Lost ou Heroes, onde há a necessidade de atores de várias etnias para agradar a todo tipo de espectador. Estavam ali russos, asiáticos, negros, latinos, homens, mulheres. Se juntasse com os europeus-ocidentais do Super Furry Animals mais o vocalista do El Mató, que é a cara do Hurley do Lost, dava pra jogar todo mundo em Paquetá e fazer um remake.
Mas na hora que Gogol Bordello começa a tocar você não vê mais a cara de ninguém. Eles se mexem no palco e os fãs se mexem ainda mais. O som pode ser étnico, influenciado por tudo que o leste europeu pode oferecer, com acordeom, violino e vodka (ou cachaça, que parece ser a bebida de predileção de Eugene desde que veio morar no Rio de Janeiro), mas vem tudo embalado numa pegada punk daqueles que você grita hey! o tempo todo e pula e poga como se levado pelo ritmo. Há também um pouquinho de algo que se assemelha a reggae.
Quando eles começam o show com "Ultimate", onde esse quase reggae bate de frente com um quase hardcore, a comparação com o Mano Negra, influência confessa de Eugene Hutz, é inevitável. Quem já foi em um show de Manu Chao, ex-líder do Mano Negra, sabe que ele é capaz de levar essa mistura reggae-hardcore por umas três horas e você ainda achar aquilo o máximo. Mas o Gogol Bordello não fica só nisso. Não que as músicas sejam tão diferentes assim. Na verdade, durante o show nem é possível distinguir quando começa uma e termina outra. Mas o que se sobressai é o caráter festivo da emulação daquela sonoridade existente na região entre a europa mais oriental e a Rússia.
E é assim que eles levam o show por umas duas horas, com destaques para "Wonderlust King" e "Start Wearing Purple" e para as batucadas com instrumentos de samba. Se minha memória alcoolizada não está falhando, até surdo teve! Para o bis, um grupo cigano entra para tocar junto com Gogol Bordello duas músicas brasileiras: "Frevo Mulher" e, muito apropriado, "Pagode Russo". Delírio do público que, sei lá se pode ser chamado de "indie", mas naquele momento não ligava mais para rótulos nem compostura. Só tive forças de observação até o momento que eles levaram "Mala Vida", do Mano Negra, meu ápice pessoal da noite. Depois disso tocaram mais coisa e de longe via bebida sendo jogada da/na platéia. Se me disserem que a festa está rolando até hoje, eu acredito. De qualquer forma, agradecemos mais uma vez ao Super Furry Animals para dizer que o show (e o texto) chegou ao
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